“Se eu pudesse usar uma metáfora, diria que
abriram a janela do meu peito e tudo de bom saiu voando. Eu carrego só
uma jaula suja e escura agora. Se eu pudesse usar uma metáfora, eu diria
que tiraram as rodinhas dos meus pés. Eu deslizava pelo mundo. Era
macio existir. Agora eu piso seco no chão, como um robô que invadiu um
planeta que já foi habitado por humanos. Mas eu não posso usar metáforas
porque seria drama, seria dor, seria amor, seria poesia, seria uma
tentativa de fazer algo. E tudo isso seria menos. Não briguei mais por
você, porque ter você seria muito menos do que ter você. Não te liguei
mais, porque ouvir sua voz nunca mais será como ouvir a sua voz. Não te
escrevo porque nada mais tem o tamanho do que eu quero dizer. Nenhum
sentimento chega perto do sentimento. Nenhum ódio ou saudade ou
desespero é do tamanho do que eu sinto e que não tem nome. Não sei o
nome porque isso que eu sinto agora chegou antes de eu saber o que é.
Acabou antes do verbo. Ficou tudo no passado antes de ser qualquer
coisa. Forço um pouco e penso que o nome é morte. Me sinto morta. Sinto o
mundo morto. Mas se forço um pouco mais, tentando escrever o mais
verdadeiramente possível, percebo que mesmo morte é muito pouco. Eu sem
nome você. Eu sem nome nós. Eu sem nome o tempo todo. Eu sem nome
profundamente. Eu sem nome pra sempre.”
Tati Bernardi, sem nome. |
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