“Trancar o dedo numa porta dói. Bater com o
queixo no chão dói. Torcer o tornozelo dói. Um tapa, um soco, um
pontapé, dóem. Dói bater a cabeça na quina da mesa, dói morder a língua,
dói cólica, cárie e pedra no rim. Mas o que mais dói é saudade. Saudade
de um irmão que mora longe. Saudade de uma cachoeira da infância.
Saudade do gosto de uma fruta que não se encontra mais. Saudade do pai
que já morreu. Saudade de um amigo imaginário que nunca existiu. Saudade
de uma cidade. Saudade da gente mesmo, quando se tinha mais audácia e
menos cabelos brancos. Dóem essas saudades todas. Mas a saudade mais
dolorida é a saudade de quem se ama. Saudade da pele, do cheiro, dos
beijos. Saudade da presença, e até da ausência consentida. Você podia
ficar na sala e ele no quarto, sem se verem, mas sabiam-se lá. Você
podia ir para o aeroporto e ele para o dentista, mas sabiam-se onde.
Você podia ficar o dia sem vê-lo, ele o dia sem vê-la, mas sabiam-se
amanhã. Mas quando o amor de um acaba, ao outro sobra uma saudade que
ninguém sabe como deter.”
Martha Medeiros. |
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